sábado, 22 de maio de 2021

ROSEIRA DESBOTADA

Chega à noite, e enquanto a chuva cai, o vento enrodilhado beija as flores e espinhos, retirando-os do caminho para observar o céu estrelado, refrescando o rosto com as gotículas de orvalho.
Uma roseira circula no tempo, caminha em desfavor do vento sem saber que rumo tomar, tendo apenas as lembranças como companhia. O começo do fim estava no seu encalço.
Viu-se flor criança nascida do amor de uma roseira pequenina que estava ali para lhe proteger, mas alguém na escuridão arrancou-a do galho da mãe e a levou para ser plantada noutro jardim. A primeira sucumbiu.
Era um jardim desconhecido, porém adubado, pois sentiu seus pés fincados no chão macio. Olhou ao redor e chorou ouvindo várias vozes desconexas. Ela nada entendeu.
Estranhou tudo, tinha um novo mundo para ser descoberto. Mais tarde ela pode chamar aquela roseira de mãe e o cravo ao lado, de pai, e nada lhe faltou. Ela sabe o que tinha guardado dentro de si.
Aproveitou o quanto pode, distribuiu carinho e atenção através das rosas nascidas dos seus galhos. Sonhou e teve a liberdade de amar intensamente carregando no olhar a florzinha inconsequente. Mas será que um dia ela foi amada também?
Eis a pergunta que não quer calar.
- Eu não sei como ainda resisto a tantos dissabores que a vida me proporcionou, também não sei se aguentarei o peso dos anos, meus galhos estão secando e as folhas murchas dão-me adeus gradativamente!
É muita solidão sem ter alguém ao lado para dividir essa agonia!
É muita tristeza acumulada no coração!
Neste momento sinto-me fraca, frágil, não passo de uma roseira desbotada, ou um número qualquer caminhando no meio da multidão de flores viçosas!
Até guando?
Outrora eu fui flor do campo untada com óleo sagrado, uma raridade universal num puro romantismo, hoje sou esquecida, as lembranças tornaram-se dolorosas e quando bate no peito não tem jeito, restando apenas saudade de um tempo que não voltará porque o copo de cristal espatifou-se e não dá para juntar os cacos.
E nesse emaranhado de raízes secas, no outono do lobo que devora a morte, escrevo cartas e jogo-as ao vento, desperdiçadas e sem respostas, as quais amanhã serão esquecidas nas gavetas do pensamento voraz.

Mj, em 08/05/2021.

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